About the Book
DESCRIÇÂOO narrador, num momento de maior angústia, assolado pelos problemas da vida, pega numa folha branca, mete-a na máquina e sente a irresistível necessidade de a ir enchendo de uma história ainda por nascer. Lembra-se da sua infância, da paisagem da serra, do rio da sua terra e de como, inesperadamente, um dia, por meados da década de cinquenta, apareceram por lá uns homens que semearam a ideia da barragem, que submergiria todas as terras e a própria casa onde vivia uma família, a dele. A partir desse dia nunca mais a vida voltou a ser a mesma. A alma das gentes dessa terra, até então completamente esquecida, ir-se-á impregnando da ideia da barragem, uns a desejarem-na, outros a temerem-na. Com esta matéria a desenvolver numa história densa de significados, transforma-se o narrador em Nicodemos Campos, um professor de cinquenta e seis anos que vive no Porto, é casado com Amélia e tem uma filha de nome Marília. Decide Nicodemos Campos, nas férias, viajar, sozinho, passados vinte anos, para a terra onde nasceu e onde, numa pousada à beira do grande lago da barragem, inventar e escrever a história da família que lhe deu a existência. Na pousada encontra um velho atarracado, o Abrão, com quem vai conversando ou imaginando que, a fim de reconstituir todos os pormenores da vida daquelas gentes. Um cordão umbilical liga-o à máquina de escrever, interceta-se, porém, com matérias das mais diversas.Sentado à máquina de escrever, vai mergulhando nas águas do grande lago e, mais acima, mais abaixo, vai revivendo tudo. Passa pela morte do Nando, um irmão de promessas, pelo seu próprio nascimento quando o Vale é ocupado por primeira vez pelo João Serrador com a mulher e os filhos, assiste aos trabalhos do João Serrador, primeiro com um burro, depois com umas touras, depois com um trator, e assiste, sobretudo à morte da mãe, da Ana do Serrador, quando se encontrava sozinha em casa, envolta em denso mistério. Revive momentos difíceis da partida do Quim, o irmão mais velho, para terras do Canadá, desiludido com o decorrer das coisas por cá, e a barragem de grilo, depois a despedida do Nando, a partida da Filomena, a irmã que vai atrás do irmão para o Canadá, e revive aqueles dias em que, após a morte da mãe, tem de se ir embora e deixar o pai sozinho no Vale, amparado pelo Domingos e pela Cristina, o casal de vizinhos mais próximo. Revive o enterro do Nando, num dia de tempestade inclemente, que impede toda a gente de estar presente no funeral. Oprimido por toda a angústia resultante desta memória, decide ir com o Abrão ao dique e, lá, encontra um busto do João Serrador e parece-lhe ouvir as palavras L'Atlàntida era ací ... e, quando acorda do sonho dessa contemplação, não vê o Abrão, grita por ele, atravessa o dique a correr, debruça-se para o abismo, o Abrão despenhou-se nesse abismo, não resistiu a um ataque de desespero.De novo no quarto da pousada, só, completamente só, atende o telefone que toca exasperado, e ouve a voz aflita de Amélia, Marília, atropelada. Mete-se no carro, acelera a todo o gás e à medida que se afasta do grande lago e da barragem, a água vai-se sumindo, tudo regressa a antes de ela ter sido, e Nicodemos Campos reduzido ao silêncio, tão só um ser de imaginação, para de novo a voz do narrador inicial e as palavras com que se iniciou a narração. E conclui que daqui para a frente é ou será tudo mais ou menos como foi até aqui.